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Quem Tem Medo do Tédio?

  • Foto do escritor: Érica Pierre
    Érica Pierre
  • 26 de jan. de 2024
  • 3 min de leitura

Atualizado: 29 de abr. de 2024

O tédio já foi um dos meus maiores medos. Eu passei por um período difícil por conta de um tratamento de saúde em que, durante a adaptação dos remédios, eu fiquei com uma crise de ansiedade absurda. E uma das minhas maiores preocupações nesse momento era não ter o que fazer e sentir que o tempo não passaria. Como se eu absolutamente precisasse de alguma atividade para fazer com que as horas seguissem. Na minha cabeça, sem isso eu ficaria quase que congelada no tempo assistindo os segundos se arrastarem morosamente. É até difícil explicar como e por que isso me deixava em pânico.


No outro extremo disso, quando eu era criança eu nem sabia o que era ficar entediada. Eu não precisava de nada para me entreter além da minha própria mente. Podia ficar horas e horas sozinha em qualquer lugar imaginando mil histórias e mundos com os mais diversos personagens. Os objetos ganhavam vida, um guarda-chuva era uma espada, um quadro na parede era um portal para outro plano. Eu sei que a criatividade é como um músculo que precisa ser exercitado. Mas quando criança esse músculo é muito mais facilmente desenvolvido. É clichê dizer isso, mas eu sinto falta desses tempos.


Eu aproveitava muito bem o ócio com essa minha imaginação fértil na infância. Hoje eu fujo do tédio de outra forma, tentando preencher todo e qualquer pequeno espaço com alguma atividade ou, no mínimo, um ruído de fundo. Até mesmo nas tarefas do dia a dia. Lavar a louça vendo série, varrer a casa ouvindo podcast, tomar banho escutando música. Quando há alguma brecha no meu dia em que não há nada para fazer eu preciso encontrar alguma coisa. Estudar, jogar, ler, escrever, passear, assistir vídeos, conversar com alguém e, claro, o maior aliado do tédio atual: as redes sociais. Se não há mais nada a fazer, eu pego o celular e fico rolando feeds afora. Sim, o excesso de telas é um grande problema para todos nós, como já sabemos. Porque, por mais contraditório que seja, quanto mais a gente mergulha em estímulos instantâneos, mais entediados ficamos e mais estímulos buscamos.


Até as crianças não estão mais tendo esse espaço livre para curtir o ócio. Até porque, mesmo quando há uma preocupação dos pais em limitar o tempo de tela, há aqueles que enchem a criança de tantas atividades extracurriculares que mal sobra tempo para brincar. Esse é outro grande problema atual, essa obsessão com a produtividade. Temos que ser produtivos o tempo inteiro. Até para conseguir aproveitar o tempo fazendo nada precisamos de uma justificativa que faça com que esse tempo seja secretamente produtivo de alguma forma. Mas pode ficar tranquilo, essa justificativa existe.


Eu estava lendo sobre a importância de ter esse tempo livre e desestruturado – porque tédio talvez não seja a melhor palavra – e vários estudos mostraram que o ócio pode fazer com que a nossa mente seja mais criativa*. Nessa hora nosso subconsciente é ativado e nossa mente faz conexões inusitadas. Por isso, a partir de hoje, vou tentar incorporar esses momentos na minha rotina. Tentar lavar a louça sem assistir a uma série ao mesmo tempo, tomar banho sem música de vez em quando e até separar alguns minutos do meu dia para não fazer absolutamente nada.


* Vou deixar aqui um link para um artigo da BBC que mostra alguns desses estudos: https://www.bbc.com/portuguese/vert-cap-41654211



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